segunda-feira, 16 de julho de 2007

Por um projeto de esquerda, socialista e democrático


Após a grave crise do PT, os militantes mobilizaram-se para levantar o partido e renovar a direção partidária। Agora, o desafio no III Congresso é fazer um balanço desse período e atualizar o projeto que queremos para o Brasil.


Miguel Rossetto *

A realização do III Congresso do PT, de 31 de agosto a 2 de setembro, mostra que o partido, aos 27 anos de vida, preserva uma regra muito importante para o avanço da democracia. É uma experiência singular um partido desta dimensão realizar um congresso com a participação de filiados em todo o país. O PT atravessou uma grave crise ética e programática, com o envolvimento de dirigentes em denúncias de corrupção. A direita tentou aproveitar essa crise para acabar com a "raça petista" e de toda a esquerda. Não conseguiu. Milhares de militantes mobilizaram-se para levantar o partido e renovar a direção partidária através de eleições diretas. O desafio, agora, é fazer um balanço desse período para reavaliar nossa estrutura e processos internos, atualizar o programa, a identidade política do partido e o projeto que queremos para o Brasil.A agenda que defendemos para o PT é a da reafirmação de um projeto de esquerda, socialista, democrático, comprometido com uma ética republicana e com uma visão de transformação do Brasil. Enfrentamos os limites e contradições da experiência de um governo de coalizão, mais amplo que o próprio partido. A reeleição do presidente Lula redobrou nossa responsabilidade para aproveitar ao máximo esse momento favorável à construção de um novo padrão de desenvolvimento econômico e inclusão social, capaz de gerar emprego e renda, com a incorporação central da questão ambiental. Queremos um diálogo claro com a juventude brasileira, vítima da exclusão e da violência. E queremos seguir construindo uma nova relação de integração entre os povos da América Latina, com desenvolvimento e justiça social. A nossa história aponta o caminho que devemos seguir.Defendemos a democratização da estrutura de poder político do país, marcada historicamente pelo patrimonialismo e pela escassa participação da sociedade. Essas agendas definem nossa identidade e a possibilidade de preservar o PT como um partido com vitalidade política para enfrentar os desafios do presente. É importante ter em mente que o Brasil vive hoje uma nova agenda. Deixamos no passado a marca de um país submisso no cenário internacional, de um país que tinha como agenda a privatização de estatais, o desmonte de políticas públicas, a desintegração da Federação e a ausência de políticas integradoras de crescimento com distribuição de renda. A agenda hoje é a do crescimento, com distribuição de renda e justiça social, através de programas como o Bolsa Família, o ProUni, o Luz Para Todos, a Reforma Agrária. É a agenda da defesa e do meio ambiente e do combate às desigualdades étnicas e de gênero. A agenda que defendemos é a da construção de políticas públicas para garantir acesso à moradia, a um sistema de saúde pública de qualidade, para a ampliação e qualificação do acesso à educação, através da criação de novas escolas e universidades e maior repasse de recursos para estados e municípios. É a de implementação de políticas de geração de trabalho através de programas como o da Economia Popular e Solidária, que reconhece o enorme esforço do nosso povo em organizar atividades produtivas de cooperativas e associações. É a do compromisso com o fortalecimento dos pequenos produtores e da agricultura familiar. Todas essas políticas, tomadas em conjunto, conformam um outro sentido e uma nova caminhada para o nosso país. Uma caminhada para transformar o Brasil em uma nação com mais igualdade, mais justiça, mais oportunidades, que resgate o direito das pessoas a uma vida digna.Uma das tarefas centrais do III Congresso é justamente preparar o PT para colaborar muito mais na confirmação dessa agenda de mudanças, ampliando a velocidade e a qualidade desse processo. Para realizar essa tarefa, o partido deve ter uma autonomia maior em relação a um governo de ampla composição partidária. O partido deve ter autonomia para abrir campanhas e debates diretamente com a sociedade brasileira, apresentando um protagonismo e uma iniciativa política maior do que apresenta hoje. A possibilidade de o país transformar-se em uma nação exige compromissos políticos claros e transformações estruturais, rompendo com aquilo que é a marca secular do atraso político, da exclusão social e da ausência da democracia. Construir a nação que queremos exige a ampliação permanente da democracia e da participação popular, com uma reforma do Estado e da democracia representativa.Por isso é tão importante incorporar experiências de democracia direta na vida política do país, qualificando as instituições e fortalecendo a República. Trata-se de uma condição importante também para enfrentar o problema da corrupção. Esse é um terreno sagrado que deve ser preservado a qualquer custo. Essa prática de apropriação privada de renda pública é inaceitável. Ela destrói a capacidade do Estado de realizar suas políticas, além de corroer a ética cidadã e a ética pública.No Rio Grande do Sul, o PT, juntamente com outras forças políticas aliadas, construiu experiências que nos dão autoridade e confiança para lutar por essa agenda de transformação. Trata-se de um compromisso que exige uma relação permanente com a população. Construímos essa prática inovadora quando governamos o Rio Grande do Sul, Porto Alegre e várias cidades gaúchas, impulsionando políticas de desenvolvimento com base na ampliação democrática do Estado. O trabalho que realizamos em vários municípios e que tem em Porto Alegre a sua principal referência nos dá confiança nessa capacidade inovadora do partido. Construímos junto com a população, ao longo dos 16 anos que governamos Porto Alegre, a maior experiência de democracia direta em escala mundial. Os resultados desse trabalho, em termos da melhoria da democracia, da qualidade de vida da população e da gestão pública, tornaram Porto Alegre referência internacional.O Orçamento Participativo e o conjunto de políticas sociais que implementamos fizeram da cidade a capital do Fórum Social Mundial, um vigoroso e criativo movimento que vem trabalhando pela construção de um outro modelo de globalização, que não seja apenas aquela do lucro. Conquistamos um grande acúmulo com essa experiência e queremos colocar esse acúmulo a serviço dessa agenda transformadora. O que fizemos em Porto Alegre e no RS nos ensinou que não há transformação verdadeira, que não há melhoria da vida do povo sem a participação deste que é o maior beneficiário de uma política de mudanças. Esse aprendizado e esse acúmulo nos enchem de confiança e vontade de avançar, orientando nosso pensamento e nossa ação política para corrigir o que precisa ser corrigido dentro do PT e, principalmente, para construir, junto com a população, o Brasil que queremos.

* Miguel Rossetto foi vice-governador do Rio Grande do Sul e ministro do Desenvolvimento Agrário.

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